quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Meninos vítimas de abusos são vistos como "garanhões"

Uma menina de 17 anos, no norte do Estado de Nova York, é forçada a fazer sexo com um professor. Em lugar de atrair simpatia, os demais alunos começam a pressioná-la por causar problemas ao professor muito popular. Ela sofre ameaças e empurrões nos corredores da escola, de parte de outras alunas. Apenas seis semanas antes da formatura, decide deixar a escola.
Um menino de 17 anos, no Colorado, é seduzido por sua atraente professora. Um vizinho conta à mãe do adolescente que aquilo era uma conquista sexual equivalente a "escalar o Everest". Ele precisa se esconder da mídia devido à atenção que seu caso gera.
Os dois casos representam crimes e abusos, mas muitas vezes terminam tratados como entretenimento. Meninas são pressionadas ao papel de sedutora ou de vítima ingênua. Meninos são vistos como garanhões. Delitos sexuais cometidos por professores são bastante comuns nas escolas norte-americanas, de acordo com uma investigação da Associated Press. Mas a reação dos norte-americanos a eles se divide fortemente com base no sexo da vítima.
"Em Hollywood, eles acham tão excitante que um rapaz transe muito novo. Mas eu posso dizer que não é tão excitante assim", afirma Jeff Pickthorn, que fala por experiência. Ele tinha 12 anos quando começou a fazer sexo com sua professora de sétima série, que tinha 24. "Eles dizem que esses caras têm sorte. Mas eu digo que isso não é sorte de jeito nenhum".
Na época em que seu envolvimento com a professora aconteceu, Pickthorn talvez concordasse com essas avaliações. Ele fez sexo com a professora por meses, até que seus pais descobrissem e a professora fosse pressionada a se demitir. Mas o caso o deixou "sem noção de fronteiras", ele afirma agora, aos 54 anos, depois de uma vida marcada por casos extraconjugais, vício em jogo e casamentos fracassados.
A pesquisa da AP sobre cinco anos de medidas disciplinares estaduais contra professores constatou que 2,57 mil educadores foram punidos por delitos sexuais. Nos casos em que o sexo da vítima é fácil de investigar, quase 90% dos predadores são homens.
Mas os meninos que são atraídos a relacionamentos sexuais com professoras recebem atenção imensa, especialmente se a mulher for atraente. Eles se tornam objeto de cobertura de imprensa constante, assunto de piadas para humoristas de TV, astros de sites que contêm fotos, vídeos e outros materiais sobre o que lhes aconteceu.
Um envolvimento que, nos casos em que a vítima é mulher, costuma ser descrito como estupro ou abuso sexual, recebe designações do gênero "ligação sexual" ou "caso amoroso" quando a vítima é um rapaz. "Os promotores tentam ao máximo não tratar esses casos de maneira diferenciada e não aplicar padrões dúplices. Mas a sociedade mesma vê de forma dúplice esse tipo de situação, e isso afeta a maneira pela qual casos desse tipo serão vistos por juízes e júris", diz Michael Sinacore, funcionário da Justiça estadual da Flórida.
Ele comandou o processo contra Debra Lafave, ex-professora do sistema escolar do Estado que admitiu ter feito sexo com um aluno de 14 anos. A atenção pública dedicada à loira de 25 anos, que tinha se casado pouco antes do julgamento, rapidamente "disparou", disse Sinacore, depois que fotos dela de biquíni, em uma moto, foram veiculadas na Internet.
"Há algo de errado em transformar uma pessoa acusada de crime sexual em celebridade", ele disse. Por fim, a família da vítima tentou evitar que o caso fosse a julgamento, devido à atenção exagerada da mídia. Lafave se confessou culpada de ataque lascivo e libidinoso e foi condenada a prisão domiciliar e liberdade condicional.
O caso de Mary Kay Letorneau, há alguns anos, atraiu atenção obsessiva dos tablóides. Casada, mãe de quatro filhos, ela teve dois filhos com um aluno. Foi sentenciada à prisão, mas se casou com o antigo aluno, que havia completado 21 anos, ao ser libertada. Carrie McCandless, 45, professora de segundo grau no Colorado, foi condenada a 45 dias de prisão por sexo ilegal com um rapaz de 17 anos.
Uma amiga da mãe do adolescente envolvido ¿ sem saber a identidade do menino em questão - disse à mãe dele que fazer sexo com McCandless "seria como escalar o Everest, para qualquer menino".
Um estudo conduzido pela Universidade de Buffalo sobre as percepções quanto a sexo entre alunos e estudantes constatou que, nos casos que envolvem professora e aluno, a situação é muitas vezes vista como "parte normal do amadurecimento", e os entrevistados usualmente se inclinam menos a considerar que a professora deveria perder sua licença.
E os entrevistados homens também se inclinam mais a ver aspectos positivos nesse tipo de relacionamento, e menos a considerar os possíveis danos de longo prazo. Os psicólogos que tratam rapazes envolvidos nesse tipo de situação afirmam que eles sofrem duplamente ¿ primeiro pelo abuso em si, e depois com a opinião generalizada de que eles têm muita sorte.
"É provável que um rapaz, em um caso de envolvimento com professora, alegue que não houve problema, não foi assédio, não foi abuso, e ele não saiu prejudicado em nada", afirma Richard Gartner, psicólogo em Nova York. O reconhecimento dos danos sofridos muitas vezes só acontece quando a vítima chega aos 30 ou 40 anos, ou até mais tarde, ele afirma.
Os problemas causados variam amplamente, dependendo da idade da vítima e da orientação sexual do rapaz e de quem tenha praticado o abuso, diz Gartner. As vítimas muitas vezes reportam vícios e distúrbios compulsivos, posteriormente, entre os quais vício em jogos de azar, sexo ou substâncias controladas, ele afirma. Meninos ou meninas, as vítimas muitas vezes terminam envolvidos em relacionamentos determinados por poder e controle, e não afeto.
Mas o sofrimento dos rapazes é desconsiderado. "Em nossa sociedade, somos condicionados a considerar que homens não são vítimas, que essa condição é peculiar das mulheres", disse Gartner. "Dizer que você é vítima, especialmente vítima sexual, significa, para muitos homens e rapazes, admitir que não se é inteiramente homem".
AP

*** Este é apenas um dos milhares de exemplos que temos, para comprovar que ainda vivemos em uma sociedade machista, medíocre, hipócrita e de FALSO MORALISMO!!!***

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